É em nome da vida que o raciocínio humano engendra justificativas para agredir o meio ambiente. E cada vez que este contra senso consegue iludir a razão, muita gente passa a interpor um espaço maior entre “meio ambiente” e “ser humano”.
A denominação escolhida, talvez, contribua para esta confusão. “Meio ambiente” conota algo externo, do lado de fora. Às vezes a gente quer “mudar de ambiente”, ou sente um “peso no ambiente”. Outros termos usados comumente no dia a dia apontam para esta “externalidade” da idéia de “ambiente”. É verdade que o conceito é claro. Mas o espectro semântico pode ser um dos fatores que, em meio a tantas provas irrefutáveis, ainda permita ofuscar a relação de causa e conseqüência entre graves transtornos do Planeta e atos ambienticidas.
Preservar florestas, cuidar de árvores, “ter dó de bichinhos”, são denunciadas como atitudes elitistas. “-É preciso plantar, construir, crescer”, dizem aqueles que usam a palavra em nome do povo desfavorecido. Essa mesma parcela majoritária da população que se engaja nas fileiras de um verdadeiro exército, a marchar sob o comando invisível da ganância de poucos.
A prática tem mostrado, de forma cada vez mais eloqüente, que as soluções rápidas, pelos atalhos que transpõem a questão ambiental, também se esgotam rapidamente. Duram pouco, não se sustentam.
Eis aí um verbete mais recente, que aprimora o vocabulário em matéria tão crucial para a sobrevivência da Humanidade. Mas uma palavra de morfologia acentuadamente verbal, adverbial, mas não substantiva. “Sustentabilidade” não é um lugar, mas um tipo de atitude, uma ação, flexível até, no máximo, a um adjetivo.
As palavras assumem maior importância quando uma questão ainda está no patamar da retórica. Uma questão de vida que ainda assim não merece o zelo visto no trato de outras temáticas relevantes, como a segurança pública. Sim, porque mesmo tendo uma extensa legislação, a aplicabilidade é capenga. As autoridades civis, os tribunais, relativizam o respeito a lei, subordinando a aplicação às mazelas sociais e até a conceitos pessoais. Mais uma prova do domínio retórico sobre o tema, a reverberar na letra de leis tão épicas, que chegam à inépcia.
A ameaça mais séria em curso contra a sobrevivência de todos e de cada um de nós ainda é uma questão de opção. Uma nação qualquer pode decidir poluir o ar de todo o Planeta, evocando simplesmente a própria soberania. Com efeito, seria descabido pensar em uma guerra em defesa do meio ambiente. Mas sanções econômicas, por exemplo, deveriam compor, senão um arsenal – pela flagrante impropriedade do termo – um aparelho reformatório para uso dissuasivo e até estratégico, diante das agressões ambientais. Hoje, discute-se num tribunal internacional de comércio o direito do consumidor boliviano pagar menos por um ipod chinês. “-Que caiam as fronteiras alfandegárias!” Mas defender a saúde da humanidade – o que obviamente inclui também o trabalhador chinês – a partir de manifestações em outros países, exigindo respeito ao meio ambiente na China, é uma afronta à soberania Mandarim.
Por isso tudo as palavras têm um papel preponderante na questão ambiental. Ainda são instrumentos autorizados, pelo menos enquanto podem ser deformadas. Depende-se delas para apontar com clareza os caminhos corretos, o passo certo entre os infinitos meandros deste cosmo de informações, que é a feição que se busca do próprio Cosmo. É necessária uma desambiguação persistente, que evite ao máximo as confusões neste tráfego perigoso de valores universais e conceitos paritários.
A proposta é criar um novo conceito, que destaque e denomine a relação indissociável entre os valores humanos tangíveis, como o meio ambiente, o trabalho, a ascenção social, a cultura, o lazer; e também a produção, a disponibilidade de matérias primas, o retorno de investimentos, o empreendedorismo, a territorialidade compartilhável entre as espécies. Um conceito que não permita relativizar o fato de que o lugar físico de todos estes valores, na forma concreta, é o meio ambiente. Ele deve ter inquestionável e indivisível precedência diante de todos os outros. Ele é o duto por onde passa o bem estar, a saúde, a própria sobrevivência. Ele é o leito do FLUXO VITAL.
A proposta é criar um novo conceito, que destaque e denomine a relação indissociável entre os valores humanos tangíveis, como o meio ambiente, o trabalho, a ascenção social, a cultura, o lazer; e também a produção, a disponibilidade de matérias primas, o retorno de investimentos, o empreendedorismo, a territorialidade compartilhável entre as espécies. Um conceito que não permita relativizar o fato de que o lugar físico de todos estes valores, na forma concreta, é o meio ambiente. Ele deve ter inquestionável e indivisível precedência diante de todos os outros. Ele é o duto por onde passa o bem estar, a saúde, a própria sobrevivência. Ele é o leito do FLUXO VITAL.
FLUXO VITAL
A natureza tem razões originárias para insistir em determinados rumos. Esta é a única direção e também o sentido do fluxo vital. Tudo que for colocado no sentido inverso, trará prejuízos para a vida na Terra. E a vida na Terra é uma só. É a mesma que a Humanidade compartilha com as outras espécies, uma vez que a sobrevivência de plantas e animais é essencial à vida humana.
Ao longo da história o ser humano engatinhou com um descuido pueril sobre este cenário delicado. Uma exigência natural da racionalidade. Mas agora já se sabe o lugar certo de cada uma das coisas: é o lugar que elas escolheram. Sabe-se também que o rumo da história não pode ser interrompido num ato. Vai ser preciso acomodar este passado, ainda no futuro de algumas gerações. E o único jeito é ter uma ação transformadora no presente, para que muitas e muitas gerações existam, bem além deste presente, de forma cada vez mais confortável e segura.
Não se fala aqui em morar debaixo de árvores. Nem mesmo em aldeias, como os ancestrais indígenas. Mas também não parece se justificar mais, sob nenhuma motivação inteligente e honesta, investir no crescimento de metrópoles cuja população, em milhões, já se mede em dois dígitos. Nesses casos, falar em moradia, em trabalho, ou mesmo em saúde, educação e lazer, é claramente contra o fluxo vital. Porque, para que todos tenham esses direitos assegurados, é necessário reduzir a população naquele espaço físico. Há que se investir no desenvolvimento. Que, no caso em questão, torna-se um antônimo de crescimento.
É esta a lógica que se pretende evidenciar: a medida da disponibilidade de recursos naturais, é a “curva” do fluxo vital. Mais escolas, unidades de saúde, moradias, mais empresas e oportunidades de trabalho são claramente a favor do fluxo vital, se estabelecidas em pequenas e médias cidades, onde recursos naturais como a água, a vegetação, a fauna, vão ter espaço minimamente suficiente. Desde que as empresas não poluam, o trabalho não seja degradante, as moradias não ocupem reservas florestais e as unidades de saúde não sejam construídas em áreas de demolição de prédios históricos. A vida passa por estes lugares.
Não há incompatibilidade alguma entre o progresso, o desenvolvimento e o meio ambiente. É isso que se pretende evidenciar neste novo conceito. Quando alguém consome uma fruta, as sementes têm que ser descartadas. Também a embalagem do marmitex. A questão é se vai ser descartada a favor do fluxo vital ou na contramão da vida. A reciclagem, no caso, vai indicar o sentido correto. A agricultura precisa continuar produzindo. Mas a cultura do desperdício, que destrói até mais de 20% na colheita, transporte e armazenagem, e outros tantos na geladeira e na mesa, precisa mudar. Não se pode mais derrubar florestas para produzir o que é desperdiçado a partir de outras áreas agrícolas.
Ao apelar pelo fluxo vital, os “vitalistas” estariam reivindicando também o progresso, as oportunidades de trabalho para todos, essas coisas que vão a favor da vida. São uma coisa só. Desde que feitas para durarem, não como paliativos, de um ciclo de miséria. É só seguir a direção e sentido corretos. O fluxo vital. No rumo da vida, que é o que todos defendem para sí.