Aqui é indispensável uma ressalva:
Nas próximas linhas vão ser descritas as características de um atendimento que pode estar fora de padrões profissionais. Trata-se da visão de um leigo. Se não servirem para serem adotadas, que sirvam pelo menos como referência do que se propõe alcançar. É claro que, a partir da orientação de profissionais que manifestem interesse em participar desta comunidade, vai ser estabelecido um atendimento dentro dos padrões recomendados cientificamente.
A idéia é que seja feita uma triagem neste atendimento. Mas não apenas uma triagem das carências, mas também das potencialidades de cada atendido.
O Psicólogo recebe o cadastro do atendido (ou do grupo familiar) com os dados que foram levantados na identificação datiloscópica eletrônica, incluindo origem/destino.
Com tempo suficiente e muita amabilidade, demonstrando que antes de mais nada está sendo feito um autêntico ACOLHIMENTO, o Psicólogo vai perguntar porque a pessoa está passando por ali, o que ela está precisando. Para onde vai. Se é pedinte regularmente e onde atua. Procura saber o que espera conseguir e como pretende encaminhar sua vida.
Pode ser oportuna alguma discussão sobre as conveniências, para o caso específico de cada grupo, de se morar numa cidade grande como Campinas.
Além dos dados objetivos sobre a pessoa ou família, esta triagem pretende iniciar a identificação dos que já estão receptivos à idéia de mudar de vida.
Mesmo assim, até então, independente do interesse que essas pessoas manifestarem, serão oferecidas a elas orientações e palavras(?) conseqüentes de incentivo. Serão convidadas a assistirem vídeos motivacionais ou orientativos, eventualmente palestras que estejam para acontecer na Central de Acolhimento naquele horário. E ainda será oferecida uma refeição completa.
A partir daí haverá diferenças nos encaminhamentos quando se tratar de pessoas de outras cidades.
O Assistente Social recebe um encaminhamento simplificado do Psicólogo. Independente da resposta obtida da pessoa ou do grupo durante o acolhimento, serão apuradas carências de roupas pessoais e calçados, para doação imediata no caso de haver disponibilidade.
O Assistente Social vai mais a fundo na realidade prática daquela pessoa ou grupo para preparar um cadastro completo. Apura se é migrante, se está em busca de atendimento médico, se procura parentes, se já mora na cidade e em que condições. Quem mais da família está pela cidade ou onde está e como. Se existem idosos, crianças, enfermos ou pessoas com necessidades especiais na família, aguardando em outro lugar. Como estão vivendo estas pessoas e qual a rotina de vida delas. Se recebem benefícios previdenciários, se participam de programas oficiais de complementação de renda, se são atendidas por alguma entidade e o que recebem.
Depois trata o outro lado da questão, informando que aquele atendimento é por uma única vez, lembrando as obrigações legais de pais diante dos filhos (quando for o caso), que a sociedade está sendo orientada a não fazer donativos nas ruas, que aquele atendimento vai ser informado aos órgãos públicos, etc.
Antes de fazer os devidos encaminhamentos, cada atendido deve passar por um plantonista.
O atendimento básico possivelmente incluirá medir pressão e temperatura, avaliar sintomas de doenças em fases epidêmicas e identificar possíveis sinais de violência física, principalmente em mulheres e crianças.
Se o Médico solicitar será feito encaminhamento para atendimento no pronto socorro municipal. E casos de violência familiar serão alvo de orientação por parte do Assistente Social, com eventual encaminhamento para o Delegado de plantão no distrito policial anexo ou representante de conselho tutelar.
Pessoas de outras cidades, que vêem em busca de atendimento médico de alta complexidade, podem ser encaminhadas para a Unicamp ou PUCC. Quem procura por parentes ou documentos, algum órgão público, também será orientado e terá o acesso facilitado por vans da própria Central de Acolhimento ou por passes de ônibus. Outros casos serão conduzidos à rodoviária, com passagem de retorno à origem.
Os dados apurados e o encaminhamento do Assistente Social serão descritos em um relatório que será arquivado. Parte do relatório, com as informações básicas, vai ser encaminhada com cópias remetidas como notificação para: -Prefeitura da cidade de origem; -SUAS - Serviço Único de Assistência Social; -Serviço Social do hospital de alta complexidade ou PS, quando for o caso. A prefeitura da cidade de origem também será notificada deste quesito, quando for o caso, para providenciar eventuais retornos ou continuidade do tratamento na cidade, se assim indicado pelo hospital de alta complexidade; -Serviço de Promoção Social da Prefeitura de Campinas.
Se este serviço não for algo claramente EMERGENCIAL e POR UMA ÚNICA VEZ, ele estará contradizendo todo seu propósito inicial. Ou seja, vai se tornar, ele próprio, o gerador do vício, da dependência de doações. Daí a necessidade de cadastrar claramente os atendidos.
Os casos de insistência podem ser encaminhados para a autoridade policial de plantão.
No atendimento do Psicólogo a pessoa ou grupo começa a receber orientação para procurar atendimento psicoterápico, quando for o caso, na rede pública ou dentro dos grupos que se pretende organizar a partir desta proposta. Vale ainda a indicação de alternativas já existentes, como "alcoólicos anônimos", recuperação de drogaditos.
Serão sugeridas também palestras ou encontros que estiverem sendo organizados para o calendário de atividades públicas. Eles devem ser programados para alguns locais da cidade.
Parte da "engenharia comportamental", praticada com sucesso através de palestras motivacionais em empresas, talvez possa ser adaptada para essas pessoas.
Na medida do interesse demonstrado será tentada uma aproximação com os grupos de orientação, com balcões de empregos ou a própria Central de Terceirização, que se pretende organizar no desenvolvimento desta comunidade.
É a semente que se pretende plantar!
De certa forma, toda essa proposta está sendo estruturada para isso. Para plantar essa semente de transformação pessoal e fazer o máximo esforço para que ela germine, se desenvolva, cresça e frutifique.
Porque se a Sociedade não pode sequer garantir direitos básicos ela precisa, no mínimo, garantir uma perspectiva de ascenção social. Essas são as linhas gerais do atendimento.
Será ainda agendada uma visita domiciliar, de outro Assistente Social.
A partir da visita domiciliar já deve ser possível começar a apurar quem está demonstrando interesse em se engajar numa proposta de mudança pessoal. E começa então o apoio sistemático àqueles que estão demonstrando interesse em mudanças pessoais.
A idéia não é criar um ambiente fictício de sucesso, de solução já alcançada. É preciso deixar claro que mudanças são difíceis, que o contexto de um país dito de "Terceiro Mundo" não favorece. Porém, mesmo diante das dificuldades, a pessoa fez uma nova opção. Um novo desafio está sendo encarado. Em nome da própria auto-estima a pessoa resolveu que quer uma vida diferente, sem precisar se expor ou agredir seu próprio ego para conseguir o que necessita ou o que simplesmente deseja.
O que se pretende é apoiar uma decisão QUE A PESSOA TOMOU. A decisão é dela, o maior interesse é dela e a Sociedade, como beneficiária indireta desta decisão, oferece um apoio previamente pactuado.
Os casos que, até então, não tiverem demonstrado interesse em mudanças, serão encaminhados para os serviços assistenciais oficiais.
Para a cinvs fica a esperança de que, um dia, essas pessoas também despertem para uma nova vida.
É importante sempre ter em mente que, dentro de um mesmo núcleo familiar, as opções podem ser muito diferentes de pessoa para pessoa. É necessário discutir então, em cada caso, como proceder diante do atendimento que será destinado à família.
Parece especialmente importante conhecer técnicas para tratamento de toxicômanos que possam ser aplicadas em larga escala. Embora eu não disponha de nenhum dado que permita afirmar, tenho a impressão de que uma grande parcela dos carentes jovens ou de meia idade, que estão pedindo na porta de estabelecimentos comerciais ou semáforos, guardando carros, são toxicômanos. Já ouvi relatos dessas pessoas sobre isso. Para as mudanças pessoais pretendidas, o tratamento desses vícios seria indispensável. Daí a necessidade de se encontrar um caminho terapêutico para tratar tanta gente o mais rápido possível. São drogas cada vez mais potentes gerando cruéis situações de dependência.